TEXTOS
CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL
A água percorre vários caminhos. Em seu curso natural encontra a aridez de rochedos, a silhueta dos corpos, o concreto das calçadas, galhos e folhas de árvores. Não importa como, seja por rios, mares ou simplesmente pela chuva fina, haverá sempre um destino para a água. O olhar de três fotógrafos, por trás das câmeras, não deixou escapar o momento ideal de atração destes dois opostos: água e terra. Para Armstrong, a mecânica dos fluidos (água) e a mecânica dos sólidos (terra) simbolizam o masculino e o feminino. Qual o lugar positivo do feminino na cultura? Seu olhar feminista suave e firme alude a Ofélia de Hamlet e à própria história da arte. “A linguagem não é neutra”, diz. Seus escritos sobre as aquarelas de Cézanne esclarecem que a impressão de cópias de fotos digitais é um encontro entre o líquido e o sólido. Sua visão histórica articula relações entre fotossíntese (clorofila) e a técnica nascente da fotografia. Ela pulverizou as cinzas do pai no mar, daí as praias acolhedoras à vulnerabilidade humana. Armstrong avoca a si a cartografia de Elizabeth Bishop: “Águas mapeadas são mais calmas do que é a terra” (O Mapa). Essa é a proposta da exposição fotográfica Onde a água encontra a terra, que o Banco do Brasil tem a satisfação de apresentar e que reúne obras dos fotógrafos brasileiros Fernando Azevedo e Leonardo Kossoy e da americana Carol Armstrong. Fernando Azevedo, aluno de Rosalind Krauss e de Armstrong, é entusiasta da teoria. Suas imagens associam fotos do lixo de Nova York a conceitos como “beleza convulsa” de Breton. O “abjeto” de Bataille está no fio de cabelo na pia – é a causa de estranhamento. Se a imagem tem o punctum de Barthes (o acaso que perturba e captura), Azevedo propõe a fotografia como studium (aquilo que é codificado no conhecimento, teoria e história) e o controle. A chuva no oceano é um campo de forças físicas (a gravidade e a mecânica dos fluidos), remete à história da água (a fotografia de Ferrez e Sugimoto ou a literatura de Machado de Assis) e ao lugar do fotógrafo. O público do Centro Cultural Banco do Brasil terá a oportunidade de apreciar o resultado desse estreito relacionamento entre fotografia e pintura, um tema fundamental ao movimento impressionista do século XIX e que continua a merecer múltiplas abordagens.
PAULO HERKENHOFF, Curador
Amostra reúne os fotógrafos Carol Armstrong, Fernando Azevedo e Leonardo Kossoy em torno do tema água e terra na relação fronteiriça dos opostos. A “água da linguagem” de Bachelard (A Poética do Espaço) se desdobra em signos, ícones, símbolos e metáforas, segundo o projeto pessoal de cada um. Roland Barthes (A Câmara Clara) é outra referência comum.
Para Armstrong, a mecânica dos fluidos (água) e a mecânica dos sólidos (terra) simbolizam o masculino e o feminino. Qual o lugar positivo do feminino na cultura? Seu olhar feminista suave e firme alude a Ofélia de Hamlet e à própria história da arte. “A linguagem não é neutra”, diz. Seus escritos sobre as aquarelas de Cézanne esclarecem que a impressão de cópias de fotos digitais é um encontro entre o líquido e o sólido. Sua visão histórica articula relações entre fotossíntese (clorofila) e a técnica nascente da fotografia. Ela pulverizou as cinzas do pai no mar, daí as praias acolhedoras à vulnerabilidade humana. Armstrong avoca a si a cartografia de Elizabeth Bishop: “Águas mapeadas são mais calmas do que é a terra” (O Mapa).
Fernando Azevedo, aluno de Rosalind Krauss e de Armstrong, é entusiasta da teoria. Suas imagens associam fotos do lixo de Nova York a conceitos como “beleza convulsa” de Breton. O “abjeto” de Bataille está no fio de cabelo na pia – é a causa de estranhamento. Se a imagem tem o punctum de Barthes (o acaso que perturba e captura), Azevedo propõe a fotografia como studium (aquilo que é codificado no conhecimento, teoria e história) e o controle. A chuva no oceano é um campo de forças físicas (a gravidade e a mecânica dos fluidos), remete à história da água (a fotografia de Ferrez e Sugimoto ou a literatura de Machado de Assis) e ao lugar do fotógrafo. O público do Centro Cultural Banco do Brasil terá a oportunidade de apreciar o resultado desse estreito relacionamento entre fotografia e pintura, um tema fundamental ao movimento impressionista do século XIX e que continua a merecer múltiplas abordagens.
O olhar de Leonardo Kossoy condensa a tradição da fotografia (Kertész) e da arte (os maneiristas e Turner: neles “o detalhe se torna o principal”). A poesia de Jorge de Lima lhe propõe o viés trágico e o modelo de conexões inesperadas. Uma piscina pode ser dispositivo ótico e lugar fenomenológico. Kossoy fotografa no Mediterrâneo, evocando a abordagem de Fernand Braudel das relações entre história e geografia. Os escritos de viagens de Leigh-Fermor ressoam sobre o olhar nômade de Kossoy e seu panorama de luz, lugar e culturas justapostas. Não mais existe terra ou água: “Vejo a fronteira como um país em si”, diz ele. Viajar e fotografar é buscar o lugar do ser poético em si.
O personagem de Água Viva de Clarice Lispector se expressa: “Sinto que estou nas proximidades de fontes, lagoas e cachoeiras, todas águas abundantes e frescas para a minha sede”. Também o fotógrafo tem sede. A voz de Água Viva queima a pele da consciência e revela “Pinto como exercício de mim”. Fotografar água é também exercício do Ser.
A ARTE E A VIDA ENTRE A ÁGUA E A TERRA, Museu Oscar Niemeyer
Onde a água encontra a terra? Nas encostas de um cânion, no rio, no mar, na chuva que precipita do céu, no ventre, na interferência de um corpo imerso, na escassez da água ou em um recipiente que molda, que a água submete. Está onde líquido e matéria interagem, em ininterrupta mutação e criação. Nestas imagens, água e terra se desdobram em signos, símbolos e metáforas no projeto de cada um dos artistas participantes da mostra.
Água e terra, para a americana Carol Armstrong, simbolizam o masculino e o feminino, o sólido e o fluido. O carioca Fernando Azevedo descobre na água os indícios da vida cotidiana e na terra, a urbanização moderna. Já o paulistano Leonardo Kossoy se põe a viajar pelo mundo e, no Mediterrâneo, encontra sua relação particular entre luz, geografia, história da arte e fotografia. São apenas rápidos aspectos superficiais da obra de cada um, devidamente apurados e aprofundados pela análise crítica do curador Paulo Herkenhoff.
Não se trata aqui de uma mostra coletiva sob a mesma temática. Além de sólida formação teórica e histórica das artes visuais, Carol, Fernando e Leonardo compartilham, entre outras, as influências dos ensinamentos do filósofo Gaston Bachelard e de Roland Barthes, um dos mais importantes críticos literários. Assim, este Museu exibe as fotografias-arte sobre as reflexões práticas e conceituais dos três artistas, que passam pela arte e pela vida Onde a Água Encontra a Terra.